Como lidar com o paradoxo do sucesso

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Pedro Nascimento

COO@Humanizadas | Chairman@Grupo Anga

A diferença entre um amador e um profissional está na busca pelo desafio e aprendizado contínuo.

O sucesso, quase sempre, nos expõe à ignorância.

Vamos supor que você é um excelente vendedor, alcança todas as metas e gera muito valor naquela função. Em reconhecimento ao seu excelente trabalho, você é promovido a gerente comercial. Mas ser um gerente comercial não é o mesmo que ser um bom vendedor. Claro que seu conhecimento de vendas será muito útil para liderar aquela equipe, mas, indubitavelmente, não será o suficiente: você precisará aprender conceitos de liderança e gestão para ter sucesso.

E isso se aplica a vários cenários: um chef de sucesso pode ter que aprender a se tornar um empreendedor de restaurantes; um escritor de sucesso pode ter que aprender a ser um bom editor do trabalho de outros; um fundador técnico de uma startup pode ter que aprender a delegar o desenvolvimento da tecnologia. No geral, quando alcançamos o sucesso em algo somos expostos a situações para qual não estávamos preparados.

E aí aonde mora o paradoxo do sucesso. A cada vitória e avanço você comprova sua capacidade, porém, se coloca em novas situações em que ele nunca havia encontrado antes. É preciso um tipo especial de humildade para entender que você sabe menos, mesmo sabendo e entendendo cada vez mais. Como disse John Wheeler, um dos cientistas por trás da bomba de hidrogênio:

“À medida que nossa ilha de conhecimento cresce, também crescem as margens de nossa ignorância.”

É justamente nesse paradoxo que mora o perigo. Se nos apegamos ao ego, às nossas realizações passadas e aos conhecimentos que já adquirimos até aqui, nos convencemos de nossa própria inteligência, buscando uma zona de conforto onde temos a certeza de que não nos sentiremos estúpidos. Com isso, nos cegamos ao que precisamos aprender. Se não mantido sob controle, o ego nos cega para o que importa.


Sobre abraçar sua própria ignorância

Já tive inúmeras oportunidades de me expor à minha ignorância. De assumir uma função relevante de liderança enquanto ainda estava na universidade, quando fazia parte do Movimento Empresa Júnior, à empreender um negócio sem saber exatamente o que era empreender de verdade. Mas um caso para mim foi o mais expressivo: quando começamos a Qura Editora no Grupo Anga.

Sempre tive o hábito de ler e buscar me preparar para a função que eu estava, e para funções futuras. Isso me ajudava a diminuir o “tamanho do passo” a ser dado ao assumir um novo papel. Quando meus sócios sugeriram que eu assumisse a liderança da Qura, achei que já estava moderadamente preparado para o papel, afinal de contas, eu já tinha alguma experiência em gestão e liderança. Mal sabia eu que estaria ocupando um papel em um negócio que exigia um entendimento em uma disciplina que eu não dominava: marketing.

Aqui vale um parênteses: nunca me identifiquei muito com marketing (apesar de admirar quem domina o assunto). Na faculdade de administração, foquei em finanças, gestão de pessoas e operações, e fiz apenas o básico obrigatório de marketing, justamente por achar que nunca trabalharia com isso. Gosto de achar que foi uma oportunidade que a vida me deu de colocar meu ego em cheque.

Nos meus primeiros meses, a sensação de incompetência era constante, afinal de contas, eu precisava liderar um time para executar muitas coisas que eu mesmo não dominava o básico. Em um primeiro momento, aquilo me gerou ansiedade e, muitas vezes, aquela voz na cabeça me lembrando “que eu talvez não fosse a pessoa certa para estar ali.”

Até que me dei conta de que só dois caminhos eram possíveis: ou desistir da função, ou engolir o ego e agir como um aprendiz. Encontrei, tanto relembrando minhas próprias experiências quanto observando de outras pessoas, fontes valiosíssimas de conhecimento que me ajudaram a evoluir e, na medida do possível, fazer o que precisava ser feito:

Aprender com os mestres

Você já parou para pensar o quão poderoso é termos a possibilidade de aprender com grandes pensadores de todas as épocas? A leitura é para mim mais do que um hábito, mas uma forma de me manter constantemente ciente das “margens da minha ilha de conhecimento.” Ler com frequência mantém seu ego em cheque ao te mostrar que sempre há muito o que aprender.

Além disso, ler é uma prática barata (considerando o custo médio de um livro), mas de retorno excepcional. Em todas as posições que ocupei, um dos primeiros exercícios que fiz foi o de mapear e ler livros que poderiam me ajudar a me preparar para o papel. Essa é uma boa forma de diminuir sua ansiedade em uma posição que você não domina, justamente porque te ajuda a ter uma “trilha a ser seguida” para performar melhor.

Uma dica que sempre funcionou bem comigo foi o de buscar entender que livros as pessoas que eu admiro leram. Você pode descobrir isso de forma mais óbvia, como perguntando diretamente para elas, lendo sobre elas (muitas pessoas escrevem sobre os livros que leem). Mas uma forma muito interessante que descobri foi identificar quais os livros ou pensadores mais citados pelos meus autores favoritos. Se um autor que você gosta mostra repetidas vezes que foi influenciado por outro, provavelmente aquele é um sinal de que você deve ir atrás da fonte.

Ralph Waldo Emerson, um dos maiores filósofos americanos, têm uma citação famosa que resume bem o aprendizado com os mestres:

“Se encontrarmos um homem de intelecto raro, devemos perguntar a ele que livros ele lê.”

Aprender com quem já fez

Aprender com quem já passou por uma posição ou desafio que você ocupa agora é uma excelente forma de “cortar caminho” no seu aprendizado, além de um baita exercício de humildade.

Quando decidi me preparar para assumir a primeira posição de liderança da minha vida, a presidência da empresa júnior que fiz parte há dez anos atrás, poucas práticas foram tão importantes quanto buscar quem já havia passado pelo papel. Mesmo tendo algumas ideias sobre o que deveria ser feito, e qual a marca que eu gostaria de deixar, foi uma experiência única ouvir de cada pessoa qual era sua visão sobre as prioridades, as oportunidades e os riscos daquele papel. A partir disso, percebo que minha própria visão evoluiu consideravelmente, e amadureceu a partir de tudo que ouvi.

Não por acaso, fiz o mesmo nas outras posições que assumi no Movimento Empresa Júnior. Como empreendedor, o hábito apenas mudou de forma: não necessariamente iria conversar com alguém que passou pela posição que eu estava ocupando (dado que estava, efetivamente, criando aquela posição), mas poderia buscar pessoas com experiências similares, por exemplo, no mercado em que eu estava atuando.

Vale destacar também que se colocar em uma posição de aprendiz, além de acelerar seu aprendizado e colocar suas capacidades em perspectiva, é uma poderosa forma de cultivar relacionamentos com pessoas que você admira.

Aprender com os dados

Já escrevi por aqui sobre a importância de se utilizar os dados para a tomada de decisão. São eles que garantem que uma decisão está efetivamente ancorada na realidade.

Pela minha experiência, um dos maiores impeditivos à utilização de dados para tomar decisões não é a falta de conhecimento técnico, e sim o ego. É difícil aceitar que você está errado, especialmente quando sua experiência aponta para uma direção, e os dados apontam para outra.

Quando fundamos a Qura, construí uma estratégia que, para mim, parecia bastante consistente. As premissas faziam sentido, e a elegância do que foi construído me enchia de orgulho. Porém, depois de algum tempo executando-a, comecei a perceber que talvez aquelas premissas estivessem erradas. Depois de pouco mais de um ano trabalhando naquela estratégia que parecia ótima, fui analisar os dados e percebi que as premissas estavam equivocadas.

Para mim, foi um choque. Será que eu realmente havia cometido um erro? Como iria contar para o time que estávamos caminhando na direção errada?

Até que percebi que o tempo gasto aceitando o erro era um tempo que poderia ser melhor gasto corrigindo-o. Engoli o ego, assumi o erro para o time, refizemos a estratégia e colocamos nossa energia em executar o novo plano. Em pouco tempo os resultados já se mostravam muito bons, e assumir o erro me ajudou a aumentar o nível de transparência com o time, ao mesmo tempo que me ajudou a cultivar humildade.

Afinal de contas, como disse Mike Tyson:

“Todo mundo tem um plano até levar um soco na boca.”

Aprender com os liderados

Assumir posições de liderança cada vez mais relevantes têm um risco inerente: quanto mais se “sobe” na carreira, maior a sua influência e capacidade de impacto. Ao mesmo tempo, mais distante você fica de onde a ação realmente acontece.

E é aí que entra a importância de estar sempre próximo de quem está executando o trabalho. Quando me perguntam que práticas de gestão um líder deve adotar, costumo dizer que a primeira de todas é uma das mais simples, porém mais impactantes: ter boas reuniões 1:1 com seus liderados.

Em todas as posições de liderança que ocupei, os 1:1s eram, além de momentos de troca, conexão e desenvolvimento, alguns dos melhores momentos que eu tinha para aprender sobre a organização e o trabalho em si. Nessas interações individuais você consegue perceber riscos que estavam fora do seu campo de visão e ter insights relevantes sobre como desenvolver melhor o time e a organização. Algumas perguntas úteis que eu utilizo em meus 1:1s:

  • O que está funcionando bem no seu trabalho?
  • O que poderia melhorar no seu trabalho?
  • Com o que você acha que eu deveria me preocupar?
  • O que estamos fazendo bem e deveríamos fazer mais?

É claro que cabe ao líder identificar o que é prioridade e não se perder nos detalhes. Mas ao ter a humildade de aprender com seus liderados, você se torna capaz de identificar novas fontes de conhecimento que, ocupando uma posição hierarquicamente superior, muitas vezes estariam indisponíveis.

Aprender com os concorrentes

Como você lida com seus concorrentes? Com raiva? Desprezo? Ou algum nível de admiração?

Parece uma pergunta estranha, mas essa também é uma prova de humildade. Muitas vezes, ao lidar com nossos concorrentes, acabamos por adotar uma postura de tentar negar ou menosprezar seus feitos, como se uma ideia não fosse boa simplesmente porque não veio de você ou da sua organização.

A verdade é que, se um concorrente é relevante, é porque está fazendo algo bem feito. E isso é algo que você pode aprender dele. Adotar uma postura de desprezo te tira uma ótima oportunidade de aprendizado.

Quando começamos o Grupo Anga, eu e meus sócios tínhamos uma postura, de certa forma, rebelde e subversiva. Como acreditávamos (e ainda acreditamos) que estávamos construindo uma nova forma de trabalhar, nos parecia natural negar ou desprezar muitas das práticas adotadas por outras organizações como ultrapassadas.

Foi muito importante para mim reconhecer o erro dessa abordagem. Se outras organizações eram relevantes, era porque suas práticas faziam sentido. Negar isso não nos permitia aprender com elas, e melhorar nosso próprio modelo. Ao perceber isso, nos tornamos mais adaptáveis, e, consequentemente, mais fortes.


No meu último ano de ensino médio, tive um professor de física, chamado Ítalo, que era meu professor favorito. No meio de suas explicações sobre ótica, movimento linear e afins, ele costumava sempre nos lembrar que “podem roubar tudo que você tem, menos seu conhecimento”. Ele nos incentivava a ler qualquer coisa e engajar em qualquer conversa, pois argumentava que aquilo poderia ser útil em algum momento.

Sempre tentei seguir à risca aquela ideia do professor Ítalo. Muitos anos depois, li uma frase de Ralph Waldo Emerson, o qual citei acima, que resume bem essa visão:

Em cada homem há algo em que posso aprender dele, e nisso sou seu discípulo.”

Não é apenas sobre ter a curiosidade de aprender (apesar disso ser uma parte importante), mas também a humildade de reconhecer que o conhecimento pode estar onde menos esperamos, e não é possível perceber sem estar preparado para tal. O sucesso só é sustentável quando reconhecemos que precisamos sempre permanecer sendo aprendizes.

Para você que está lendo até aqui, desejo sucesso no caminho profissional que escolher. Mas mais do que isso, desejo a humildade intelectual para continuar aprendendo, e assim, se preparar para maiores e melhores sucessos.


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Espero te ver aqui mais vezes, e até a próxima!