Você já ouviu falar na parábola dos cegos e o elefante?
Conta-se que um grupo de cegos, que nunca tinha visto um elefante, foi levado até um. Curiosos, cada um tocou em uma parte diferente do animal. Um deles tocou na tromba e disse: “Este animal é como uma cobra grande!” Outro, ao tocar em uma das pernas, afirmou: “Não, ele é como uma árvore, forte e resistente!” O terceiro, sentindo a orelha, declarou: “É como um leque, grande e plano!” Outro, tocando na presa, disse: “Ele é como uma lança afiada!” Por fim, o último cego, ao tocar no dorso, concluiu: “Este animal é como uma parede sólida!”
Cada um, com base em sua experiência limitada, formou uma ideia diferente sobre o que era o elefante. A discussão entre eles foi intensa, pois cada um estava certo de sua percepção, mas nenhum conseguiu ver o elefante como um todo.
Essa parábola se aplica diretamente à forma como as organizações interagem com seus stakeholders. Stakeholders são todos aqueles que têm interesse ou são impactados pelas atividades de uma organização: clientes, funcionários, investidores, fornecedores, comunidade local, ONGs, órgãos reguladores, entre outros. Cada um deles com suas próprias visões e prioridades. Por exemplo, os clientes geralmente estão focados na qualidade e no preço dos produtos, enquanto os investidores buscam retorno financeiro e sustentabilidade a longo prazo. Os colaboradores querem segurança no emprego e um ambiente de trabalho saudável, enquanto a comunidade local pode se preocupar com os impactos ambientais da empresa.
Assim como os cegos, cada grupo de stakeholders tem uma visão, uma perspectiva parcial da organização baseada em sua própria experiência. Quando uma empresa não ouve ou considera apenas uma parte limitada das perspectivas disponíveis, corre o risco de enxergar apenas uma parte do “elefante”, deixando de perceber aspectos críticos que podem levar a decisões equivocadas e até influenciar sua estratégia.
De acordo com a pesquisa da Humanizadas (2023), mais de 64% dos líderes não possuem clareza suficiente sobre as necessidades e percepções de valor dos stakeholders. Essa visibilidade limitada sobre questões organizacionais vai além da simples falta de dados; trata-se de uma incapacidade de compreender o escopo completo dos desafios enfrentados.
A diversidade de perspectivas não é algo negativo. Pelo contrário, ela reflete a riqueza de conhecimentos e experiências dentro e fora de uma organização. Ouvir os stakeholders oferece uma série de benefícios que vão além da simples coleta de feedback. Quando uma organização se dedica a escutar ativamente, ela consegue identificar oportunidades que talvez não estivessem visíveis antes. Por exemplo, os próprios clientes podem sugerir inovações em produtos ou serviços que atendam melhor às suas necessidades, enquanto os funcionários podem oferecer insights valiosos sobre como otimizar processos internos. Essa prática ajuda a empresa a se adaptar rapidamente às mudanças do mercado enquanto fortalece seu posicionamento competitivo, uma vez que suas decisões são baseadas em uma compreensão profunda das demandas e expectativas de todos os públicos relevantes.
Além disso, a escuta ativa promove um ambiente de confiança e transparência, fundamentais para construir relacionamentos sólidos e duradouros com os stakeholders. Quando as pessoas se sentem ouvidas e valorizadas, a lealdade à organização tende a aumentar, resultando em maior engajamento e suporte, mesmo em tempos de crise. Esse relacionamento positivo pode ser um fator decisivo na hora de superar desafios e explorar novas oportunidades, pois uma base de stakeholders comprometidos e satisfeitos se torna uma aliada poderosa na construção de um futuro sustentável para a empresa.
Após ouvir todas as partes interessadas, o próximo desafio do processo é lidar com uma gama de interesses e expectativas diversas. Satisfazer as demandas de stakeholders tão variados quanto clientes, comunidades locais e investidores pode parecer uma tarefa impossível. Porém, realizar a escuta de maneira estruturada, dar transparência aos resultados, assim como ao processo de tomada de decisão, geralmente diminui possíveis atritos.
Em última análise, a capacidade de ver o “elefante inteiro” – ou seja, ter uma visão abrangente da organização e entender sua complexidade – é o que pode diferenciar e tornar as empresas mais competitivas. Mas, para isso, é essencial que elas estejam dispostas a sair de suas bolhas.
Por Elisa Mazocco, Research and Audit Team Leader da Hu.